uma limpeza de top

Eu costumo procrastinar afazeres e decisões e vou acumulando coisas, sobretudo papéis (coisas da profissão). Mas há um dia - há sempre um dia - em que ponho as mãos nos armários e vai tudo fora. Mesmo tudo.
E é assim como no resto da minha vida.
Tinha dito que ia fazer isso no verão, mas se calhar o verão chega mais cedo. :)



Da verdade do amor

Da verdade do amor se meditam
relatos de viagens confissões
e sempre excede a vida
esse segredo que tanto desdém
guarda de ser dito

pouco importa em quantas derrotas
te lançou
as dores os naufrágios escondidos
com eles aprendeste a navegação
dos oceanos gelados

não se deve explicar demasiado cedo
atrás das coisas
o seu brilho cresce
sem rumor

José Tolentino Mendonça, in "Baldios"

Ninguém tem pena das pessoas felizes

Ninguém tem pena das pessoas felizes. Os Portugueses adoram ter angústias, inseguranças, dúvidas existenciais dilacerantes, porque é isso que funciona na nossa sociedade. As pessoas com problemas são sempre mais interessantes. Nós, os tontos, não temos interesse nenhum porque somos felizes. Somos felizes, somos tontaços, não podemos ter graça nem salvação. Muitos felizardos (a própria palavra tem um soar repelente, rimador de «javardo») vêem-se obrigados a fingir a dor que deveras não sentem, só para poderem «brincar» com os outros meninos. 
É assim. Chega um infeliz ao pé de nós e diz que não sabe se há-de ir beber uma cerveja ou matar-se. E pergunta, depois de ter feito o inventário das tristezas das últimas 24 horas: «E tu? Sempre bem disposto, não?». O que é que se pode responder? Apetece mentir e dizer que nos morreu uma avó, que nos atraiçoou uma namorada, que nos atropelaram a cadelinha ali na estrada de Sines. 
E, no entanto, as pessoas felizes também sofrem muito. Sofrem, sobretudo, de «culpa». Se elas estão felizes, rodeadas de pessoas tristes, é lógico que pensem que há ali qualquer coisa que não bate certo. As infelizes acusam sempre os felizes de terem a culpa. É como a polícia que vai à procura de quem roubou as jóias e chega à taberna e prende o meliante com ar mais bem disposto. Em Portugal, se alguém se mostra feliz é logo suspeito de tudo e mais alguma coisa. «Julgas que é por acaso que aquele marmanjo anda tão bem disposto?», diz o espertalhão para outro macambúzio. É normal andar muito em baixo, mas há gato se alguém andar nem que seja só um bocadinho «em cima». Pensam logo que é «em cima» de alguém. 

Ser feliz no meio de muita gente infeliz é como ser muito rico no meio de um bairro-de-lata. Só sabe bem a quem for perverso. 
Infelizmente, a felicidade não é contagiosa. A alegria, sim, e a boa disposição, talvez, mas a felicidade, jamais. Porque a felicidade não pode ser partilhada, não pode ser explicada, não tem propriamente razão. Não se pode rir em Portugal sem que pensem que se está a rir de alguém ou de qualquer coisa. Um sorriso que se sorria a uma pessoa desconhecida, só para desabafar, é imediatamente mal interpretado. Em Portugal, as pessoas felizes sofrem de ser confundidas com as pessoas contentes. 

Miguel Esteves Cardoso, in 'Os Meus Problemas'

replay



Irmãos químicos



Só para limpar os tímpanos da Emeli por um bocadinho.
Há dias em que não faço nada de jeito, mas fica tanta coisa feita.

E comboios? Os comboios, senhores?


Quero dar-te a coisa mais pequenina que houver

bago de arroz
grão de areia
semente de linho
suspiro de pássaro
pedra de sal
som de regato
a coisa mais pequena do mundo
a sombra do meu nome
o peso do meu coração na tua pele.

Rosa Lobato de Faria

spam

Não bastava oferecerem-me soluções para aumentar o pénis e para aprender Inglês, agora enviam-me emails sobre como fazer com que um homem se apaixone por mim... Ao lado, senhores dos emails aleatórios, completamente ao lado.

a felicidade

são as coisas quotidianas mas com os pés dois centímetros acima do chão.

bandas sonoras

Tal como para os filmes há bandas sonoras, eu tenho as minhas para cada ano que passa.
No ano passado, foi a Lana del Rey, os Mumford and Sons, o Pablo Alboran, o Santaolalla, a Emily Haines, a Mindy Gledhill e a Pink.
A Emeli Sandé está no top para 2013.
Now... focus! Focus! 
Porque amanhã é um longo dia no batente.
(mas enquanto o batente não bate... play it again)


Amor como em Casa


Regresso devagar ao teu
sorriso como quem volta a casa. Faço de conta que
não é nada comigo. Distraído percorro
o caminho familiar da saudade,
pequeninas coisas me prendem,
uma tarde num café, um livro. Devagar
te amo e às vezes depressa,
meu amor, e às vezes faço coisas que não devo,
regresso devagar a tua casa,
compro um livro, entro no
amor como em casa.

Manuel António Pina, in "Ainda não é o Fim nem o Princípio do Mundo. Calma é Apenas um Pouco Tarde"

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De vez em quando pego num livro de poesia e fico feliz como num dia de sol depois da chuva. 
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Esta é uma das canções

a que volto sempre durante os últimos anos.
Uma espécie de fio de adriadne, 
porque até o minotauro teve ajuda para sair do labirinto. :)



da ternura

"Não devemos ter medo da bondade; mais ainda: nem sequer da ternura. (...) O preocupar-se, o guardar, o cuidar requerem bondade, pedem ser vividos com ternura." A ternura não é "a virtude dos débeis; pelo contrário, denota fortaleza de ânimo e capacidade de atenção, de compreensão, de verdadeira abertura ao outro, de amor. Não devemos ter medo da bondade, da ternura".

Papa Francisco