eletrocardiograma

- Pode levantar-se.

Eu com os resultados na mão e a doutora a dizer-me que o eletrocardiograma estava perfeito. E eu a não saber se tão perfeito assim. Repare bem. Olhe outra vez, porque não sei se tantos cacos disformes conseguem uma simetria perfeita de linhas no papel milimétrico.

- Pode levantar-se.

Levanto-me, mas não sei para onde ir a seguir. Logo ali à saída que estrada hei de tomar. Se calhar não tão perfeito, senhora doutora.     
É essencialmente disso que sinto falta. De sentir a pele cálida de alguém de quem gosto junto à minha. Debaixo do edredon. No meio de conversas mais sérias ou de risota incompreensível para outras pessoas que não nós duas. 


A new self and the importance of elsewhere

«I wanted to find a new self in a distant place, and new things to care about. The importance of elsewhere was something I took on faith. Elsewhere was the place I wanted to be. Too young to go, I read about elsewheres, fantasizing about my freedom. Books were my road.
(...)
The wish to travel seems to me characteristically human: the desire to move, to satisfy your curiosity or ease your fears, to change the circumstances of your life, to be a stranger, to make a friend, to experience an exotic landscape, to risk the unknown, to bear witness to the consequences, tragic or comic, of people possessed by the narcissism of minor differences. Chekhov said, "If you're afraid of loneliness, don't marry." I would say, if you're afraid of loneliness, don't travel.»
Paul Theroux, The Tao of Travel: Enlightenments from lives on the road, 2011



a história

Hoje tive mais uma vez esse insight. Podemos viver histórias fenomenais, mas elas só têm valor se as partilharmos com alguém de quem gostamos muito.

The Fantastic Flying Books of Mr Morris Lessmore


música insistente

Tinha pensado escrever umas linhas muito sérias sobre a reserva espiritual e emocional de cada um (que observo todos os dias nas pessoas), mas deixo apenas a última da Katy Perry. 
E que os deuses nos livrem de termos a cabeça cheia de cabelos brancos e pensarmos que tivemos "the one who got away". Bem... mas antes "the one who got away" do que "the one who got away with it". 




The Great Railway Bazaar

Gosto muito de literatura de viagens e mais ainda nestes dias frios, de trabalho, em que apetece antes pegar na mochila e andar por aí.

De literatura de viagens e de comboios. Por isso, este é um livro perfeito. Autobiográfico, Paul Theroux conta as peripécias da sua viagem de comboio de Inglaterra até à Ásia, com passagem pela Índia. Escreve sobre pessoas, lugares, comidas, crenças e culturas. Ainda estou no início, mas promete.

Tenho memórias muito felizes relacionadas com uma mochila às costas e com um bilhete do intercidades no bolso com destino ao Porto. Preferindo viajar do lado esquerdo, a viagem em si é magnífica e a chegada ao Porto, avistar o rio e a cidade, é qualquer coisa que me enche de uma emoção que tenho muita dificuldade em narrar. 
O Porto não foi um amor à primeira vista e, talvez por isso, seja dos mais profundos que nutro por uma cidade portuguesa. É um lugar de chegada e também de partida para outras paragens europeias. É, em suma, um lugar carregado de memórias afetivas muito doces.
Quando me perguntavam em pequena sobre os meus desejos para a vida adulta, eu deveria ter dito, se conhecesse nessa altura a palavra, "Quero ser uma backpacker". 
Mesmo quando as costas já não mo permitirem, tenho a certeza que continuarei a ser uma backpacker.   
    



The Master, de Colm Tóibín

Um livro muito bom. O Henry James dá uma grande personagem de ficção, embora ele fosse um homem um bocado triste e auto-reprimido. Fiquei com vontade de ler mais, tanto do James como do Toibin.




Eu nem ia falar disto, mas dada a quantidade de publicações nos murais do facebook, não me consigo conter. 
A morte transforma as pessoas, sobretudo as que estão vivas.  




"Death makes angels of us all and gives us wings where we had shoulders..."
Jim Morrison



É sábado e vou fazer crepes

Antigamente se queríamos que toda a gente soubesse que íamos fazer crepes, saíamos de casa e gritávamos: "Ei, pessoal, vou fazer crepes!"

Hoje em dia, faz-se login, escreve-se e publica-se.




o burro e o poço


Era uma vez um burro que caiu num poço. Embora o poço tivesse secado, não havia nenhuma maneira de sair de lá e burro zurrou por socorro.
Passadas umas horas, o seu dono, um agricultor, notou o pedido de ajuda, mas ele nunca tinha gostado muito do burro, porque comia frequentemente as suas colheitas e prestava pouco serviço no campo.
O agricultor julgou que tinha ali uma oportunidade para se livrar do burro malandro e para tapar o poço, prevenindo que um dos seus filhos caísse nele.
Assim, o homem começou a atirar terra para o poço.
Nesse instante, o burro percebeu que o agricultor estava a tentar matá-lo e o animal gritou ainda mais alto, mas o agricultor não se importou.
Passado algum tempo, o burro calou-se. O fazendeiro pensou que tinha matado o burro e continuou a atirar pazadas de terra para terminar a tarefa.
Porém, o burro não estava morto. Ele tinha tido uma ideia. 
Abanou-se, a terra caiu no chão e ele calcou-a. A cada pazada, ele repetia o processo. Sacudia-se e calcava a terra, sempre em silêncio. O agricultor, julgando-se triunfante nos seus intentos, continuou a lançar terra ao poço. Fê-lo com tanta concentração que nem reparou que, a certa altura, surgiram as orelhas do burro à entrada do poço. O burro saiu num pinote e trotou para bem longe dali. 

bondade

Levo em crer que as pessoas fazem sempre o melhor que podem. Se não fazem melhor, é porque não sabem. Ser gentil e bondoso são coisas que se aprendem.

rindo e sonhando

Esta noite acordei a rir. Já não é primeira vez que me acontece. 
E é uma emoção fenomenal. :)




Paris

Na verdade, o que se me afigura no horizonte é Paris no verão, durante duas semanas, com a estadia paga.

Sozinha.
E acho que não quero ir sozinha, if you know what I mean. Preferia partilhar a viagem com alguém significativo. Acho que vou abrir um casting. :D



fotografias


A Susan Sontag dizia coisas muito interessantes, acerca da vida em geral e da fotografia em particular. E calhou hoje pensar eu em fotografias. Sintra deu-me para isso.
A minha máquina avariou-se e não tenho sentido vontade (ou necessidade) de a substituir.
Sim, o telemóvel também tem uma câmara bastante razoável que até fixa o momento relativamente bem.
Tenho no entanto a sensação que este é o momento em que nada de relevante possa ser capturado.
É certo que tenho andado por aí, para norte e para sul, entre o campo e a cidade, todos os fins-de-semana sem exceção. Que me levanto antes do sol nascer para andar por aí. Que até redescobri o prazer de conduzir sozinha e até à noite.
Espero não ter que fazer um reflexão daqui a um ano ou dois e lamentar esta escolha. Ou então não. Talvez até venha a descobrir com mais veemência que este tempo não foi nada mais nada menos do que sublime. Mas em todo o caso não sei. Às vezes, o futuro parece uma viagem (pode ser de comboio, que eu gosto de comboios) para a qual não sabemos se temos bilhete.
A verdade é que não sabemos absolutamente nada acerca do futuro.



“I want to be able to be alone, to find it nourishing - not just a waiting.” 
― Susan SontagReborn: Journals and Notebooks, 1947-1963