Uma arte


A arte de perder não é difícil de dominar;
há tantas coisas que parecem conter em si a intenção
de serem perdidas que a sua perda não é desastre algum.

Perde qualquer coisa todos os dias. Aceita o nervosismo
pelas chaves perdidas, pelas horas mal gastas.
A arte de perder não é difícil de dominar.

Depois experimenta perder mais longe, perder mais depressa:
lugares e nomes e o destino para onde tencionavas 
viajar. Nada disso provocará desastre algum.

Eu perdi o relógio da minha mãe. E, vê bem, foram-se-me as últimas 
ou as penúltimas casas que mais amei.
A arte perder não é difícil de dominar.

Perdi duas cidades, ambas adoráveis. E alguns reinos
mais vastos que foram meus, dois rios, um continente.
Tenho saudades deles, mas perdê-los não foi um desastre.

Mesmo perder-te (o tom de voz irónico, um gesto que
amo) é algo que não devo omitir. É evidente
que a arte de perder não é difícil de dominar
embora possa parecer (Escreve-o!) um desastre.


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