O que acontece no escuro

Quando comecei a ler o Auster, há uns anos, não o achei nada de extraordinário, mas entretanto descobri nele um dos escritores mais inspirados do nosso tempo. 

"Man in the dark" é a história de um homem que tem insónias e que, madrugada dentro, inventa mentalmente narrativas para se concentrar em alguma coisa que não sejam os destroços da sua vida e das vidas da filha e da neta que habitam a mesma casa, a qual acaba por ser uma certa ilha para três náufragos. Há quem conte carneiros, ele conta histórias. Pessoalmente, o livro prendeu-me logo aqui, porque às vezes eu faço o mesmo quando não consigo conciliar o sono.

A escrita de Auster é simples, clara e despretensiosa. Mas há sempre um parágrafo que nos surpreende quando menos esperamos. Uma ideia fora do vulgar que nos deixa a olhar para as páginas, a sorrir e a pensar "nunca me tinha ocorrido isto".

Uma das coisas mais tocantes da escrita dele são os acasos, aqueles pequenos pormenores que na escrita e no cinema nunca são acessórios. Acabam até por ser essenciais para uma certa redenção das personagens e dão-nos uma certa sensação que também na nossa vida nada é por acaso, que as coincidências não existem realmente e que a redenção é possível.

Não importa o livro que se leia dele, é certo que vamos encontrar referências a filmes (o homem é cinéfilo dos sete costados), a Nova Iorque e provavelmente ao baseball. As personagens dos livros são pessoas que poderíamos conhecer e nas suas existências podemos ver um pouco de nós próprios.
É no carácter plausível e quotidiano dos enredos de Auster que reside essencialmente o seu encanto.



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